FICHAMENTO-ARTIGO 6
Ficha de Resumo
Ficha de Resumo
Potencial evocado auditivo tardio relacionado a eventos (P300) na síndrome de Down
Braz. j. otorhinolaryngol. (Impr.) vol.76 no.2 São Paulo Mar./Apr. 2010doi: 10.1590/S1808-86942010000200010
Carla Patrícia Hernandez Alves Ribeiro César, Doutora em Ciências dos Distúrbios da Comunicação, Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Docente e Coordenadora do curso de Fonoaudiologia da Universidade Metodista de São Paulo. Universidade Metodista de São Paulo; Heloisa Helena Caovilla, Fonoaudióloga e Doutora, Professora Associada da Disciplina de Otologia e Otoneurologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Universidade Metodista de São Paulo;Mário Sérgio Lei Munhoz, Médico Otorrinolaringologista e Doutor, Professor Associado da Disciplina de Otologia e Otoneurologia da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Universidade Metodista de São Paulo; Maurício Malavasi Ganança, Médico Otorrinolaringologista e Doutor, Professor Titular da Universidade Federal de São Paulo - Escola Paulista de Medicina. Professor do Programa de Mestrado em Reabilitação Vestibular e Inclusão Social da Universidade Bandeirante de São Paulo. Universidade Metodista de São Paulo.
O potencial evocado tardio relacionado a eventos (P300) está relacionado com o processamento cognitivo; é gerado quando um estímulo infrequente e aleatório é detectado entre uma série de estímulos frequentes. Os seus parâmetros de avaliação são latência e amplitude. A latência varia de acordo com a dificuldade para discriminar um estímulo raro entre estímulos frequentes e a amplitude varia de acordo com a improbabilidade do estímulo. As ondas N2 e P3 são as de maior interesse, pois representam fenômenos fisiológicos associados a eventos mentais relacionadas com a memória e aprendizagem; a onda N2 está relacionada com a tomada de decisão ou a discriminação dos estímulos; a ausência das ondas N2 e P3 indicam um comprometimento maior, como demência pré-senil ou senil.
Latência aumentada de P3 e amplitude reduzidaforam identificadas na síndrome de Down. O aumento de latência estaria relacionado com deficiências sensoriais e cognitivas no processamento da informação, em particular retardando a categorização da informação auditiva e seriam atribuídas a diferenças na capacidade do cérebro em organizar e responder na síndrome de Down.
O aumento da latência de P3 e a diminuição da amplitude, encontrados em indivíduos idosos hígidos durante o processo de envelhecimento, foram identificados precocemente em indivíduos com síndrome de Down, cerca de 20 anos mais cedo. Uma corrente teórica procura refletir sobre a existência da demência pré-senil do tipo Alzheimer em indivíduos com síndrome de Down e ressalta a importância do P300 na investigação da tríade: envelhecimento - síndrome de Down - doença de Alzheimer.
O exame foi realizado em sala silenciosa, isolada acusticamente e semiescura, com o paciente sentado, de forma confortável, em poltrona reclinável com suporte para a cabeça. A pele e o couro cabeludo foram limpos com pasta abrasiva (OMNI) e foi colocada uma pasta eletrolítica entre a pele e os eletrodos para melhor condutividade. Os eletrodos foram fixados com esparadrapo do tipo micropore na fronte (Fpz), vértex (Cz), parietal (Pz) e nos lóbulos das orelhas esquerda (A1) e direita (A2), segundo o padrão do sistema internacional 10-2021. Os eletrodos foram conectados ao pré-amplificador e este foi fixado à vestimenta dos indivíduos. Em Cz e Pz a polaridade dos eletrodos foi positiva e em A1 e A2 (interligados por meio de jumper), a polaridade foi negativa. A impedância elétrica foi inferior a cinco Kohms em cada derivação e inferior a três Kohms entre duas derivações diferentes durante todo o procedimento.
As ondas do eletroencefalograma foram amplificadas 10.000 vezes, com uma banda de um a 30 Hz e uma sensibilidade de aproximadamente 50mv. Os artefatos foram rejeitados usando-se um circuito interno do equipamento que excluía do processo de mediação todas as gravações com potenciais que excediam a 45mv; quando os artefatos ultrapassaram 20% dos estímulos apresentados, o exame foi interrompido e o paciente foi orientado a evitar tensão muscular, movimentação ocular ou corporal; o exame foi reiniciado após cinco minutos de descanso.
As ondas N1, P2, N2 e P3 com polaridades negativa-positiva-negativa-positiva, respectivamente, foram registradas e replicadas, diante de estímulos auditivos frequentes e raros; N1 e P2 foram marcados nos estímulos frequentes e N1, N2 e P3 nos estímulos raros. A latência foi medida no ponto de máxima deflexão de cada onda e as amplitudes foram mensuradas entre os pontos de máxima deflexão de N1 e P2 e de N2 e P3. Nas ondas com picos duplos, triplos ou múltiplos foi medido o pico de maior deflexão ou a onda com a melhor duplicação.
Nesta pesquisa, o P300 foi um teste de fácil aplicação e interpretação em indivíduos com síndrome de Down. Todos os indivíduos com síndrome de Down e os do grupo controle evitaram atividades físicas e mentais estressantes antes da realização do P300 auditivo; houve o cuidado de excluir da amostra os casos que não seguiram as orientações, mostraram fadiga, falta de atenção ou dormiram durante o procedimento. As latências N1, P2, N2 e P3 e as amplitudes N1- P2 e N2 - P3 foram os parâmetros considerados nesta pesquisa. Dos 17 indivíduos com síndrome de Down, 12 (70,6%) evidenciaram uma ou mais anormalidades das latências N2 e P3 e/ou amplitudes N1- P2 e N2 - P3. Encontramos atraso na latência N2 em 29,4% dos casos, atraso nas latências N2 e P3 em 23,5%, atraso na latência P3 em 5,9%, atraso na latência N2 e aumento da amplitude N1-P2 em 5,9% e ausência dos componentes N2 e P3 em 5,9%, quando comparados aos resultados de indivíduos saudáveis23, utilizando o mesmo procedimento de levantar a mão frente ao estímulo raro.
Foi constatado que as latências N1, P2, N2 e P3 foram maiores no grupo com síndrome de Down, dado similar ao de outros experimentos. A diferença das médias da latência P3 entre os indivíduos com síndrome de Down e as do grupo controle foi de 71 ms, sugerindo que a idade média estimada dos indivíduos com síndrome de Down seria 96 anos, em contraste com a idade média cronológica relatada de 25 anos. A literatura consultada referiu que o P300 demonstraria os efeitos do envelhecimento humano, observado pela lentificação do processo de avaliação do estímulo e redução da capacidade de atenção seletiva; a latência P3 aumenta aproximadamente um milissegundo por ano de vida. Como a latência de P3 está aumentada em indivíduos idosos hígidos e em indivíduos com síndrome de Down, supomos que a hipótese de envelhecimento precoce referida na literatura pudesse ser utilizada no grupo estudado. No entanto, o aumento da latência de P3 encontrado em nossa pesquisa poderia estar relacionado apenas com as deficiências sensoriais e cognitivas no processamento da informação, que retardariam a categorização da informação auditiva e seriam atribuídas a diferenças na capacidade do cérebro em organizar e responder na síndrome de Down.
As alterações das latências e amplitudes do P300 podem ser justificadas por diferentes perspectivas teóricas, quer sejam por falha na habituação cortical, por redução na quantidade de fibras nervosas na condução do estímulo auditivo, pelo próprio distúrbio cognitivo ou ainda pelo surgimento da doença de Alzheimer em portadores da síndrome de Down.
A identificação de alterações nas latências e amplitudes do P300 em indivíduos com síndrome de Down comprova a importância do procedimento e sugere a realização de pesquisas que acompanhem a evolução destes casos para tentar elucidar o comportamento de deficientes mentais sem síndrome de Down, de indivíduos com doença de Alzheimer, de indivíduos com alterações neuroendocrinológicas e de idosos sadios.
Em indivíduos jovens adultos com síndrome de Down ocorreu aumento das latências N1, P2, N2 e P3, e diminuição da amplitude N2-P3 do potencial evocado auditivo tardio relacionado a eventos (P300), sugerindo prejuízo da integração da área de associação auditiva com as áreas corticais e subcorticais do sistema nervoso central.
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